Ferrovia

Baixo Guandu teve grande destaque no Espírito Santo, no Brasil e no mundo em 13 de novembro de 2015 quando a lama de rejeitos da barragem de Bento Rodrigues que estourou em Mariana-MG contaminava o rio Doce, na altura de Baixo Guandu, um dos rios que banham o município. O maior crime ambiental do Brasil era cometido pela Vale-BHP-Samarco e tinha como espectadores brasileiros, especialmente mineiros e capixabas que assistiam perplexos o curso da contaminação sem agir.

Era o 2º ano do meu primeiro mandato como prefeito de Guandu e como se não bastasse os impactos negativos da seca, da recessão econômica que atingia o país, agora chegava uma crise ambiental sem precedentes.

A medida que a lama se aproximava, mais indagações surgiam na cabeça dos capixabas e guanduenses e mais respostas faltavam. “O que iria acontecer com a água contaminada e a população ribeirinha, poderíamos consumir a água”.

Após sucessivas tentativas de contato sem sucesso com os diretores da Vale, tivemos a ideia de bloquear a ferrovia da Vale em Guandu.

Paralisamos a ferrovia às 18 horas do dia 16 de novembro e ficamos por mais de duas interrompendo o transporte de minério de ferro. Equipamentos e maquinários foram colocados sobre a linha do trem. Havia umas 100 pessoas comigo. Era preciso coragem para tomar esta atitude.

Só deixamos o local por determinação da justiça por meio de uma liminar que a Vale obteve na Justiça, em favor da “liberdade econômica” que estabelecia uma multa diária de R$ 100 mil no meu nome. Nascia naquele dia a primeira das etapas de busca incessante pela compensação do crime.

Aviso pelo Facebook

A intenção foi chamar a atenção dos diretores da Samarco (Vale/BHP Biliton) para que fôssemos ouvidos pela empresa e tivéssemos uma resposta para a sociedade local. Me lembro que comuniquei aos diretores sobre a paralisação do trem pelo Facebook com a seguinte mensagem:

Presenciamos atônitos um crime ambiental sem precedentes. Muitos assistem impassíveis a morte do rio, mas com implicações caóticas para toda a região”

Neto Barros em publicação no Facebook, novembro de 2015

Muitas pessoas não fazem ideia dos prejuízos incalculáveis ao meio ambiente e à população ribeirinha que a tragédia causaria. Fomos à Governador Valadares, em Minas Gerais, verificar de perto as consequências para a água. Lá, fomos alertados para tentar pelo menos salvar algumas espécies de peixes do Doce.

Me lembro que colhemos a água do rio Doce, em Valadares já atingido com os rejeitos da lama da Samarco e ficamos surpresos com a análise do resultado: “tinha uma tabela periódica inteira”. A água estava contaminada com sedimentos de minério de ferro, arsênio, manganês. Os peixes morreram asfixiados. Foi desesperador!

Retornamos à Guandu e tomamos providência. Participamos da operação “Arca de Noé” com o apoio do governo estadual para tirar os peixes do rio Doce e levar para criadouros do Ifes.

Era preciso ter força, coragem e determinação para lidar com a situação caótica. Além de ir para os trilhos do trem, fui ao Palácio Anchieta para pedir ajuda ao governador e a Brasília buscar recursos e soluções para tragédia do rio Doce.

Na época, também me reuni com o fotógrafo Sebastião Salgado, reconhecido internacionalmente, natural de Aimorés (município mineiro que faz limite com Guandu) e coordenador do programa de reflorestamento “Olhos D’água”. Foi depois dessa reunião que tive com o Sebastião Salgado que nasceu a Renova, instituição para gerir e executar os programas e ações de reflorestamento que pudessem minimizar os impactos à fauna e à flora das espécies do Rio Doce.

Luta pelas indenizações

A partir do ato de interromper o funcionamento da ferrovia, assumi a liderança na defesa dos interesses dos prefeitos da Bacia do Doce incluindo todos os administradores dos municípios de Minas Gerais e Espírito Santo, instigando-os a reivindicar justas indenizações. Era o mínimo que a multinacional devia ao povo capixaba.

O blogueiro Bruno Torturra escreveu no dia 13 de novembro de 2015 no “Estúdio Fluxo” que havia um vácuo de liderança política para enfrentar o crime ambiental da Samarco e suas consequências devastadoras para a economia e o meio ambiente.

Na época, a então presidenta da República, Dilma Rousseff, sobrevoou a região da bacia do Doce, mas não foi suficiente para unir esforços com outras lideranças parlamentares e mineiras a fim de buscar minimizar os danos.

Confira o trecho da reportagem de Bruno Torturra:

Foi preciso o prefeito de uma cidade pequena do Espírito Santo, Baixo Guandu, para demonstrar ao Brasil a dimensão do vácuo de liderança política que sufoca o país. Ministérios, parlamentares, o governo de Minas, a oposição, as lideranças partidárias, publishers... ninguém chegou perto da clareza, da articulação simples e didática, da assertividade ao fazer as perguntas certas e definir as demandas urgentes de Neto Barros. O contraste de sua fala e cargo com a correspondência em Dilma é mais uma das não-metáforas que definem essa desgraça nacional.

Mobilizei os outros prefeitos dos municípios atingidos e liderei a principal ação de indenização contra a BHP, na Inglaterra, que é acionista da Vale-Samarco.

Foram mais de R$ 1 bilhão de indenizações em Guandu e 750 milhões em Aimorés. E em paralelo à nossa gestão eficiente, Baixo Guandu conseguiu dar o salto socioeconômico nunca antes visto pela população. Nunca desisti de lutar pelos atingidos e nem pelo meio ambiente, tanto que depois organizamos discussões e diversos encontros com o Movimento dos Atingidos por Barragem.

Conseguimos a verba para a construção do hospital da cidade, no valor de R$ 18 milhões. Participei do programa da SECTI, Sementes do Rio Doce, que captou 7,5 milhões para acelerar projetos de startups e fomentar o empreendedorismo nos municípios atingidos, entre outros.

Para acessar algumas reportagens que foram destaque na época do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG, é só você clicar nos links disponíveis na sessão Na Mídia, aqui mesmo no site.

Depois representei os municípios da bacia do Rio Doce e litoral atingidos pelo crime ambiental.

Fiz um trabalho que deixou na época os guanduenses menos inseguros em relação aos prejuízos ambientais. Quem quiser relembrar detalhes e a repercussão em sites e portais de notícias no mundo todo é só dar um Google em mim e digitar “crime da Samarco e Neto Barros”.